Oscar 2023: Entre Tudo ou Nada

“Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo” foi o filme que mais venceu estatuetas, 7 no total. Logo atrás, vem “Nada de Novo no Front”, com 4 prêmios

o cinematógrafo
8 min readMar 13, 2023
Elenco, diretores e produtor de “Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo” | Getty Images

A 95º cerimônia do Oscar aconteceu na noite deste domingo (12) no Dolby Theatre, em Los Angeles. A premiação mais importante e popular do cinema ficou entre “Tudo” ou “Nada”. O filme da A24, Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo confirmou o favoritismo de suas 11 indicações. O longa dirigido por Daniel Kwan e Daniel Scheinert venceu sete estatuetas, incluindo Melhor Filme.

A última vez que um filme conquistou o mesmo número de prêmios foi em 2014, com “Gravidade” (2013). Se a análise for restrita apenas a vencedores de Melhor Filme, o último a ultrapassar o vencedor de 2023 foi “Quem quer ser um Milionário” (2008), que angariou oito Oscars, inclusive da categoria principal.

Foi uma “varrida” nos prêmios como não se via há muito tempo. O resultado só não foi maior, pois o filme alemão Nada de Novo no Front conquistou quatro estatuetas em: Design de Produção, Filme Internacional, Fotografia e Trilha Sonora . O domínio dos dois filmes é tão notável que, mesmo somando todos os outros vencedores, não chegam às 11 estatuetas conquistadas pela dupla Tudo-Nada.

Surpresas e Esnobes

É inevitável. Todos os anos, entra Oscar, sai Oscar, há sempre uma única certeza: não agradar todo mundo. Em algumas edições, a alta carga de imprevisibilidade faz com que a cerimônia seja mais dinâmica e impactante. Em outras, como essa, o favoritismo se mantém e a cerimônia funciona como uma coroação do trabalho mais querido pelos membros votantes da Academia de Artes Cinematográficas.

Mesmo com a confirmação das previsões, isso não impediu de momentos surpreendentes e, claro, emocionantes. A vitória de Jamie Lee Curtis, de “Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo, na categoria de Atriz Coadjuvante, não era tida como certa. Ao lado dela, o páreo era duro contra Angela Bassett, que interpretou a rainha Ramonda em Pantera Negra: Wakanda Para Sempre. Muitos não acreditaram no anúncio de Troy Kotsur (“No Ritmo do Coração”) e Ariana DeBose (“Amor, Sublime Amor”). Tampouco Curtis e Bassett.

Tirando esse prêmio, considerado o mais inesperado, o que se seguiu foi a comprovação dos favoritos e discursos emocionantes. Ke Huy Quan, vencedor na categoria de Ator Coadjuvante, por sua performance em “Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo”, falou sobre família, migração e sonhos.

“Minha jornada começou em um barco. Eu fiquei um ano em um campo de refugiados, e de alguma maneira eu parei aqui, no maior palco de Hollywood”, contou o ator. “Eles dizem que histórias como essa acontecem apenas nos filmes. Eu não consigo acreditar que está acontecendo comigo. Esse é o sonho americano”.

O discurso de Brendan Fraser, premiado como Melhor Ator, pela atuação em “A Baleia”, e o de Michelle Yeoh, que desbancou Cate Blanchett na categoria de Atriz pelo trabalho em “Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo, foram igualmente comoventes.

“Eu comecei nesse mercado há 30 anos, e as coisas não vieram fáceis para mim. Houve uma facilidade que eu não gostei na época, até que depois parou. Eu só quero agradecer por esse reconhecimento, porque não poderia ser alcançado sem o meu elenco”, disse Fraser.

“Para todos os meninos e meninas que se parecem comigo e estão assistindo, isso é uma sinalização de esperança e possibilidades”, discursou Yeoh, em referência à representatividade asiática. “Obrigado à Academia, isso é a história sendo feita”.

Apesar de toda a emoção evocada nos discursos dos vencedores, muitos filmes amargaram com nenhuma estatueta. Com o domínio dos dois principais filmes, ficaram sem nada: Os Banshees de Inisherin (indicado a nove Oscars), Elvis (com oito indicações), Os Fabelmans (nomeado em sete categorias), Tár (indicado a seis Oscars) e Triângulo da Tristeza (com três nomeações).

Atuações: passado e presente

Os vencedores das categorias de atuação: Brendan Fraser, Michelle Yeoh, Ke Huy Quan e Jamie Lee Curtis | Getty Images/ The Hollywood Reporter

Muitas vezes, convém-se falar que um ator ou atriz venceu “pela carreira”. O exemplo mais específico e recente disso talvez seja Leonardo DiCaprio, que, após uma série sucessiva de derrotas, venceu por seu papel em “O Regresso” (2015).

Nesta edição, entretanto, não tem como imaginar os prêmios como uma espécie de reparação da Academia, até porque todos venceram em suas primeiras nomeações. Ainda assim, o prestígio de vencer o Oscar, de certa forma, sempre remete à carreira dos vencedores, o público relembra trajetórias e papéis que levaram cada um deles até ali.

Começando pela primeira vencedora da noite, Jamie Lee Curtis. O cinema para a atriz vem de berço, filha de Janet Leigh (“Psicose”) e Tony Curtis (“Spartacus”). Seu primeiro papel foi em “Halloween” (1978), interpretando a protagonista Laurie Strode. Após a estreia, Curtis se consolidou como uma atriz de terror, muitas vezes referida como “Scream Queen” (rainha do grito). Ela esteve também em “Sexta-Feira Muito Louca” (2003) e mais recentemente “Entre Facas e Segredos” (2019).

Ke Huy Quan é o segundo “mais velho” no que diz respeito à projeção em Hollywood — apesar de ser o mais novo entre os quatro. A carreira do ator começou quando ele ainda era criança. Sua estreia foi em “Indiana Jones: O Templo da Perdição” (1984), como Short Round. No mesmo ano, Quan estrelou mais um clássico oitentista, dessa vez “Os Goonies” (1984). A carreira dele, no entanto, começou a esfriar com papéis cada vez menores, inclusive contracenou com Fraser em “O Homem da Califórnia” (1992). Por conta disso, ele entrou em hiato até retornar às telonas vencendo maior prêmio da indústria.

Brendan Fraser, por sua vez, teve seu primeiro papel de destaque justamente em “O Homem da Califórnia”. Após essa performance, o ator deslanchou no cinema comercial, fez “George, o Rei da Floresta” (1997), “A Múmia” (1999) e o vencedor do Oscar “Crash” (2005). A carreira estelar sempre em filmes de grande bilheteria também minguou devido ao quadro depressivo e um caso de assédio envolvendo um dos responsáveis pelo Globo de Ouro. Com “A Baleia”, Fraser emocionou e merecidamente ganhou sua estatueta.

Por fim, Michelle Yeoh é uma atriz que caiu no cinema quase que de paraquedas. Ela estudou, primeiramente, para ser bailarina, mas, por ocasiões do destino, se tornou uma lenda dos filmes de ação de Hong Kong. A visibilidade internacional veio com “O Tigre e o Dragão” (2000), vencedor do Oscar de Filme Internacional. Depois, passou a ser presença em outros longas como “Memórias de uma Gueixa” (2005), “Podres de Ricos” (2018) e “Uma Segunda Chance para Amar” (2019).

A Academia, portanto, reconheceu atores que há muito estão na estrada, muitos deles, inclusive, com destaque em filmes de gênero. Yeoh em wuxias e filmes de ação, Curtis em filmes de terror, Quan e Fraser em filmes de aventura e comédia. De certa forma, o reconhecimento passa também pela renovação dos membros, afinal o maior vencedor da noite não se encaixa no rótulo tradicionalista de “filme de Oscar”. Como é bom ver estrelas do passado conseguindo merecida aclamação no Oscar.

Outro ponto interessante da vitória dos quatro, além das trajetórias profissionais pouco convencionais para os moldes do Oscar, é que todos os vencedores atuaram em filmes da A24.

A24: histórico em premiações

Colagem com “Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo”, “Marcel the Shell with Shoes On”, “Aftersun” e “A Baleia”, longas da A24 indicados ao Oscar | Collider

A distribuidora e produtora norte-americana A24 divide opiniões. Existem aqueles que amam e aqueles que odeiam. Eu, particularmente, me sinto mais inclinado ao primeiro grupo, em razão da liberdade aos cineastas e do apuro estético que rompe com a pasteurização hollywoodiana vigente. Enfim, fato é que a produtora coleciona cada vez mais fãs, inclusive uma página no Twitter dedicada à A24 coleciona quase 90 mil seguidores.

Mesmo com o alvoroço e festa pelas vitórias da produtora na 95º cerimônia do Oscar, venceu 9 das 14 categorias que disputou, essa não foi a primeira aparição e nem mesmo o primeiro prêmio de Melhor Filme da A24.

A companhia fundada em 2012 já possui em seu currículo 54 nomeações ao Oscar. Em 2023, foram 18 (11 para “Tudo em Todo Lugar”, 3 para “A Baleia”, 1 para Aftersun, “Marcel The Shell With the Shoes On”, “Causeway” e Close). O primeiro Oscar que a A24 mostrou seu potencial foi em 2016, quando Brie Larson venceu a categoria de Melhor Atriz por “O Quarto de Jack” (2015). Na mesma ocasião também venceram “Ex-Machina” na categoria de Efeitos Especiais, e “Amy” levou a estatueta de Melhor Documentário.

Até a noite de ontem, nenhum filme da distribuidora tinha atingido a glória que “Moonlight” (2016) alcançou em 2017, ao vencer Ator Coadjuvante (Mahershala Ali), Roteiro Adaptado e, claro, Melhor Filme, em uma cerimônia inesquecível em razão da confusão envolvendo os envelopes trocados com “La La Land”.

Outro prêmio vencido pela distribuidora e que já parecia antecipar o protagonismo asiático foi o Oscar de Atriz Coadjuvante, na edição de 2021, para Youn Yu-Jung, pela performance como a avó em “Minari” (2020).

Em 2023, a distribuidora conseguiu se firmar como uma adversária a ser batida nas próximas edições do Oscar. Com nove prêmios, a A24 reafirma sua posição dentro da indústria e evidencia a alta capacidade de conexão e paixão que seus filmes, mesmo “diferentões”, causam no público e, agora, nos votantes.

Confira todos os vencedores do Oscar:

Melhor Filme: “Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo

Melhor Direção: Daniel Kwan e Daniel Scheinert por “Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo

Melhor Atriz: Michelle Yeoh por “Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo

Melhor Ator: Brendan Fraser por “A Baleia

Melhor Atriz Coadjuvante: Jamie Lee Curtis por “Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo

Melhor Ator Coadjuvante: Ke Huy Quan por “Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo

Melhor Roteiro Original:Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo

Melhor Roteiro Adaptado:Entre Mulheres”

Melhor Montagem:Tudo em Todo Lugar ao Mesmo Tempo

Melhor Fotografia: Nada de Novo no Front

Melhor Som:Top Gun: Maverick

Melhor Design de Produção:Nada de Novo no Front

Melhor Figurino:Pantera Negra: Wakanda para Sempre

Melhor Maquiagem e Penteado:A Baleia

Melhores Efeitos Visuais:Avatar: O Caminho da Água

Melhor Trilha Sonora: Nada de Novo No Front

Melhor Canção Original: Naatu Naatu por “RRR

Melhor Animação:Pinóquio de Guillermo del Toro

Melhor Filme Internacional: Nada de Novo no Front

Melhor Documentário:Navalny

Melhor Curta Documentário:Como Cuidar de um Bebê Elefante

Melhor Curta Live Action:An Irish Goodbye

Melhor Curta Animação:O Garoto, a Toupeira, a Raposa e o Cavalo

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