Robert Eggers: a renovação do terror histórico e atmosférico

o cinematógrafo
5 min readMay 11, 2022
Robert Eggers é um dos grandes novos nomes no cinema

Dos diretores da nova geração do terror, o meu preferido, sem dúvidas, é Robert Eggers. Dessa nova geração do terror, para mim, há três diretores que a representam: Jordan Peele, Ari Aster e o próprio Eggers. Existe uma contemporaneidade nas obras desses cineastas, elas surgem mais ou menos na mesma época. Eggers faz A Bruxa em 2015, ao passo que Peele e Aster estreiam na direção ambos em 2017, com Corra e Hereditário, respectivamente.

No grandioso ano de 2019, um dos melhores do cinema da última década, todos esses diretores lançaram filmes. Eggers realizou O Farol; Aster, Midsommar e Peele, Nós. Em 2022, espera-se que o trio lance novos filmes também. O Homem do Norte, de Robert Eggers, estreia nesta quinta (12), adaptando Hamlet, de Shakespeare. O longa de Peele, Não! Não Olhe já teve seu primeiro trailer lançado. O filme de Ari Aster, Disappointment Blvd., ainda não teve sua data de estreia anunciada.

Apesar de surgirem mais ou menos no mesmo período e estenderem suas filmografias quase simultaneamente, os diretores se diferem bastante no tom de seus longas, compartilham, porém, uma mesma essência: o terror. Peele ruma mais para um horror social, com bastante crítica e questões raciais. Os filmes de Aster encontram terreno na vertente do terror psicológico. Por fim, Eggers representa o terror histórico e atmosférico. Suas obras são de época, deslocadas da contemporaneidade. Para a realização destes longas, Eggers dedica-se bastante à pesquisa histórica a fim de construir a atmosfera do período.

A predileção de Eggers por filmes de época é evidente. Em entrevista à GQ Magazine, o cineasta afirmou: “Qualquer período histórico me interessa, exceto o que estamos vivendo”. Assim, não é de se admirar que todas suas obras sejam de época e os próximos projetos do diretor também, como um remake de Nosferatu e a minissérie sobre o místico conselheiro do Império Russo, Rasputin.

A Bruxa (2015)

Com Anya Taylor Joy no papel principal, a estreia de Robert Eggers na direção é um terror ambientado na Nova Inglaterra, EUA, no século XVII. A família protestante e tradicional de Thomasin (Joy) é excomungada de sua comunidade, assim, se instalam às margens de uma floresta. Isolados do restante do mundo, a família lida com as dificuldades da plantação e com uma força sobrenatural que habita a floresta.

Já nesse filme é evidente a consistência na direção de Eggers e como a construção do ambiente é um dos fatores que promovem o terror. O lugar inóspito, com uma paleta de cores pálidas não é dos mais convidativos. Ele gradualmente constrói seus conflitos, que começam com o sumiço do pequeno Samuel, o recém nascido da família. A tensão adquire dois tons: a desconfiança da família um com o outro e a presença da Bruxa na floresta.

Os gêmeos, agora os mais novos da família, acusam Thomasin de ser a bruxa da floresta, ao passo que a irmã acusa os dois de conversarem com o diabo na forma do bode Black Phillip. Religiosidade e terror andam muitas vezes juntos. Aqui não é diferente. Possessões e exorcismos destroem aos poucos o seio familiar tradicional que possuíam.

A presença da Bruxa é tratada com mistério pela direção de Eggers. Ele oculta sua face, só a mostra no escuro. Dessa forma, todas as cenas que acontecem na floresta são cheias de imprevisibilidade, pois a qualquer momento a Bruxa pode aparecer, seja em sua forma habitual, como uma mulher sedutora ou nos olhos de um indefeso coelho, por exemplo.

A Bruxa é um filme de terror que se preocupa mais com a construção da tensão do que com episódios aterrorizantes em si. O desenvolvimento lento faz com que as resoluções, as quais possuem de fato o horror habitual do gênero, sejam mais potentes, o impacto final é que mantém o espectador pensando em toda a jornada dos personagens.

O filme está disponível no Prime Video e no pacote Telecine na Globoplay.

O Farol (2019)

Em O Farol, Eggers continua algo que ele se propôs a fazer em A Bruxa: pesquisa histórica. Examinando documentos dos faroleiros do século XIX, ele criou seus personagens, suas loucuras e o terror. Aqui, a parte de ambientação vai para além dos cenários e do design de produção, o vocabulário dos personagens é arcaico como da época retratada — vale dizer que em A Bruxa também existe essa rusticidade vocabular.

Winslow (Pattinson) é um jovem que se inscreve para cuidar de um farol, seu companheiro é o experiente Thomas (Dafoe), que há muito exerce essa função. Isolados do mundo e tendo como companhia apenas eles mesmos, lentamente a sanidade dos dois vai desaparecendo. Eggers claramente gosta de explorar elencos pequenos em condições de isolamento, repetindo esse aspecto em seus dois primeiros filmes.

Com o tédio que assola a dupla, restam a eles apenas cumprir com suas funções e procurar se entreter. A montagem nos minutos iniciais reforça a noção de rotina que os dois possuem, mas entre as tarefas, uma é proibida para Winslow: vigiar o farol. O mistério toma conta do lugar e, assim como Winslow, ficamos curiosos, sem saber o que lá acontece, só temos vislumbres quando as alucinações aparecem.

Sem nada para fazer, Winslow reluta mas cede à bebida. O alcoolismo e a falta de convívio social são responsáveis pelo enlouquecimento do personagem, que delira com sereias, tritões e tentáculos. É também gradual esse processo, se desenvolve lentamente até um potente clímax. Fica difícil para o próprio espectador diferenciar o que é loucura e o que é realidade confinado naquele espaço.

Pelo fato do filme ser preto e branco e com uma proporção de tela quase 4:3, O Farol é bem menos convencional que seu longa anterior, mas preserva a essência de filme independente. A fotografia consegue construir a sensação claustrofóbica dos personagens e suas dinâmicas de poder. A iluminação com os lampiões surgem sempre abaixo do rosto dos personagens, o que promove sombras nas paredes e nos rostos, transformando-os em verdadeiros monstros. O exemplo mais claro disso talvez seja a cena em que Thomas amaldiçoa Ephraim.

O Farol é um dos melhores filmes de 2019, e isso já diz muito sobre a qualidade do longa. Novamente, a ambientação e o desenvolvimento excruciante são elementos fundamentais para a construção do terror. As cenas gráficas também chocam, porém a tensão reside na imprevisibilidade da história e do desabamento da sanidade dos personagens.

O filme entrará na Netflix no dia 18 de Maio.

Expectativas e O Homem do Norte

Eu, enquanto fã do diretor, estou ansioso para seu novo longa. É importante salientar que o filme não será de terror, se assemelhará mais a um épico de ação com Vikings e bastante violência. Por mais que aqui o terror não seja o motor, com certeza encontraremos suas marcantes características de filmes atmosféricos, construindo um ambiente histórico, antigo e inexplorado.

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